
Paulo Roberto Falcão, 71, é uma das pessoas entusiasmadas com a contratação do italiano Carlo Ancelotti, 65, para dirigir a seleção brasileira. Velho amigo do italiano, vê nele as qualidades necessárias para fazer sucesso no time nacional verde-amarelo.
“É uma liderança que vejo no Carlo”, disse o ex-jogador à Folha de S.Paulo. “É um cara espetacular, não mudou absolutamente nada. Ele não é afetado por tudo o que ganhou. Torço para que ele possa fazer um bom trabalho, e certamente vai fazer.”
PERGUNTA – Como começou a sua relação com o Carlo Ancelotti?
PAULO ROBERTO FALCAO – Eu o chamo sempre de Carlo. Quando eu cheguei à Roma, em agosto de 1980, ele estava chegando também do Parma. Ele não mudou absolutamente nada, a não ser as vitórias [risos]. Mas não mudou nada, especialmente a humildade. Ele não é afetado por tudo o que ganhou. Ele trata todo o mundo da mesma maneira, é um cara espetacular. Como treinador, não preciso falar nada. Ganhou tudo em todo lugar que trabalhou. Então, eu gostei muito da vinda dele. Acho que o Brasil vai ganhar com ele, assim como ele vai ganhar a experiência de trabalhar no Brasil. Torço para que ele possa fazer um bom trabalho, e certamente vai fazer.
PF – Tudo na vida tem prós e contras, certo? Tudo. Na seleção brasileira, ele escolhe os jogadores que ele quer para fazer o esquema que ele quer. Em clubes, muitas vezes, não é possível. Ele disse ter trabalhado com 34 brasileiros, então sempre houve essa relação. Ele vai ter menos dias para se preparar para o primeiro jogo, depois vem outra partida, também com poucos dias, mas ele conta com muitos jogadores talentosos. Vai poder organizar o esquema que quiser, porque os jogadores que estão à disposição podem buscar o que ele pedir. Ele é muito inteligente.
P. – Ele sempre teve carinho pelo Brasil?
PF – Sempre teve essa relação. Ele conhece, gosta do Brasil, gosta do futebol brasileiro. Quando cheguei à Itália, lembro que ele cantava para mim a música do “Meu Amigo Charlie Brown”, do Benito di Paula. Você não deve conhecer, porque é novo, mas fez muito sucesso. E eu cantava para ele “Champagne”, de Peppino di Capri. Naquela época, havia um intercâmbio da música brasileira com a italiana, mas isso parou. Então, ele ficou com uma, e eu, com a outra. Ele começou a conhecer um pouquinho do Brasil por conta da música. Nós tivemos um amistoso contra o São Paulo em 1984, mas ele não jogou porque estava machucado, se não me engano. Ele também estava na comissão do Arrigo Sacchi, em 1994, quando o Brasil conquistou o tetra. Aquele foi o ano que fez a diferença, porque o Brasil tem cinco Copas do Mundo e a Itália tem quatro.
PF – Não houve proposta. Também ainda não conversamos. Ele está chegando agora, tem que ficar à vontade para fazer as coisas no tempo que bem entender.
Você já disse que o Ancelotti é um cara que sabe desmontar polêmicas. Essa parece uma característica necessária atualmente, com tudo o que acontece na CBF.
Essa é uma característica muito boa que ele tem, que acho que pegou com as sacadas do Nils Liedholm [jogador e técnico sueco morto em 2007], nosso treinador na Roma. Ele tinha essa capacidade de desmontar qualquer problema na hora, fazia as pessoas rirem apesar de um assunto sério. É uma liderança que vejo no Carlo. O Nils, na época em que jogava no Milan, enfrentou o Puskás, que era do Real Madrid. É uma história que conto nas minhas palestras.
O Puskás era o Messi dessa época. Ele fez três gols no jogo, e o Nils disse: “Eu o marquei bem”. O repórter respondeu: “Mas ele fez três gols”. E o Nils rebateu: “Mas só fez três, certo?”. Aí, as pessoas caíram na risada. O Carlo é assim. Claro que, na hora em que precisa, ele vai para o confronto, mas é muito difícil, muito raro. Claro que falo isso pelo que vejo, afinal sou cinco ou seis anos mais velho, então não tive como ser jogador dele [risos].
P. – Você já fez alguns intercâmbios com ele, inclusive no ano passado, no Real Madrid. Foi o último encontro?
PF – Isso, foi a última vez que nos vimos. Foi no jogo entre Real Madrid e Manchester City, que acabou em 3 a 3 [em 9 de abril de 2024, pelas quartas de final da Liga dos Campeões]. Eu tinha passado um tempo com eles lá, acredito que entre uma semana e nove dias, e ele me perguntou se eu achava que o que foi feito nos treinamentos foi aplicado durante o jogo. Ele pergunta mesmo, tem o diálogo, não é o dono da verdade, apesar de ter a capacidade de ser. Eu já fui várias vezes nos clubes em que ele trabalhou. A comissão dele é muito boa. E ele está muito feliz de vir ao Brasil, que é o mais importante.
P. – Falta pouco mais de um ano para a Copa do Mundo. O Ancelotti deve construir a seleção pensando no Neymar ou é hora de olhar mais para jogadores como Vinicius Junior e Raphinha?
PF – Essa é uma situação que depende dele, depende do Neymar. Ele tem toda a potência. Ele tem que querer. Eu também não estou dizendo que ele não quer ou que não está podendo por um motivo ou por outro. Eu não convivo assim com o Neymar para ter opinião. Eu não gosto de dar uma opinião em cima de coisas que eu não vejo e não acompanho.
Raio-x: Paulo Roberto Falcão, 71
1953, Santa Catarina – É ex-jogador, ex-treinador e comentarista de futebol. Começou a carreira no Internacional em 1973, atuando também por Roma (Itália) e São Paulo, onde se aposentou em 1986. Disputou as Copas do Mundo de 1982 e 1986 pela seleção brasileira. Pelo período na Itália, ficou conhecido como ‘Rei de Roma’.
Fonte: Folhapress
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