Preso em jaula, tiro no rosto e espancamento. A cada hora, uma criança sofre violência em Brasília

Só nos primeiros 8 meses do ano, a PCDF registrou 5.057 ocorrências de violência contra crianças e adolescentes

Espancamento, bala perdida e tortura. Todos os dias a Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) recebe, em média, 21 registros de violência contra crianças e adolescentes.

Os dados fazem parte de um relatório inédito obtido pelo Metrópoles e elaborado pela Divisão de Análise Técnica e Estatística (Date). Conforme mostra o levantamento, só nos primeiros oito meses deste ano foram 5.057 ocorrências. Se a contagem for feita por meio do relógio, chega-se a triste marca de quase um caso a cada hora.

No período analisado, os meios de violência mais empregados registrados contra esse público foram ameaça (17%), agressão moral (11%), violência física (8%), subtração (5%) e violência sexual (4%). A rua e dentro de casa são os lugares onde mais ocorrem agressões: 30% cada.

De acordo com a delegada-chefe da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), Simone Pereira, pessoas que vivem próximas às vítimas precisam ficar atentas aos menores sinais de possíveis agressões.

“É preciso ouvir as crianças e os adolescentes. Eles têm muito a contar, às vezes não com palavras, mas, sim, com pequenas mudanças de comportamento. Traumas podem provocar mudanças como o fato de crianças violentadas voltarem a fazer xixi na cama”, explica.

Preso em jaula

No começo do ano, um dos casos que chocaram a capital foi a de um garoto de 7 anos encontrado com marcas de espancamento pelo corpo e colocado dentro de uma jaula.

Segundo testemunhas, o pai, de 31 anos, brigou com a esposa e, depois, espancou o filho, usando o fio de um carregador de celular. Em seguida, arrastou a criança pelo chão e a deixou dentro do veículo.

Em vídeo gravado por um dos policiais que atendeu a ocorrência, a criança descreveu a violência. O menino relatou que o agressor bateu nele “com um chicote”. No dia seguinte, a Justiça concedeu liberdade provisória ao pai da criança.

Em abril, um garoto de 2 anos foi atingido por uma bala perdida no olho durante uma troca de tiros. Segundo a PM, havia três pessoas em uma casa na Quadra 10 do Varjão, onde também estaria a criança. Um desafeto chegou ao local e atirou, acertando um homem. Um dos indivíduos de dentro do imóvel, também armado, revidou, mas acabou baleando o menor.

Foto cedida pela família ao MetrópolesMenino de dois anos baleado no olho

Mais recentemente, em setembro, uma bebê de apenas 1 ano e 10 meses foi acolhida pelo Conselho Tutelar de Santa Maria Sul, com marcas de queimaduras e hematomas pelo corpo.

Após avaliação médica, o profissional que atendeu a menina na unidade de saúde atestou que as marcas na pele da criança são de possíveis queimaduras e pancadas. Ela foi encaminhada para cuidados da família materna e está sob a guarda do avô. O caso está em investigação para identificação dos responsáveis pelo ato.

Dados devem ser utilizados para políticas públicas

O especialista em segurança Leonardo Sant’Anna chama a atenção para as cidades onde há maior número de ocorrências. “São os locais onde o Estado toca menos. Mesmo que Brasília apareça ali no meio, se deve muito mais pelo fluxo de pessoas de outras regiões pelo centro”, explica.

Para ele, é importante destacar também que a maioria das vítimas, quase 56%, é do sexo feminino. “A gente percebe que a violência já começa desde jovem e, infelizmente, tem uma continuidade na vida adulta”, destaca.

Adriana Valeriano, advogada especialista em direito familiar, ressalta a importância de que sejam registrados os casos, pois ainda há problemas de subnotificação. “É necessário que seja incentivado que todas essas situações de violência cheguem até à polícia para fins de investigação”, comenta.


Fonte: Metrópoles