Trump pode incitar mais violência se não for condenado, diz acusação de impeachment

Trump poderia perder seus direitos políticos caso fosse condenado, mas, para que isso aconteça, são necessários 67 votos dos 100 senadores –cenário hoje considerado improvável

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No terceiro dia de julgamento do impeachment de Donald Trump, a acusação encerrou formalmente sua argumentação com a tese de que o ex-presidente é um perigo para a democracia e pode incitar mais violência caso não seja condenado pela invasão do Capitólio e volte à Casa Branca.

Diante do Senado americano, deputados democratas –que funcionam como procuradores do caso– usaram na sessão desta quinta-feira (11) depoimentos de invasores para mostrar que a turba seguiu ordens diretas de Trump no ataque que deixou cinco mortos em 6 de janeiro. Sem demonstrar remorso, dizem os acusadores, o ex-presidente pode insuflar novos episódios de brutalidade se puder disputar novamente as eleições.

“Não tenho medo que Donald Trump concorra novamente [à Casa Branca] em quatro anos”, disse o deputado democrata Ted Lieu, um dos nove integrantes da acusação. “Tenho medo que ele concorra de novo e perca, porque ele pode fazer isso de novo.”

Trump poderia perder seus direitos políticos caso fosse condenado, mas, para que isso aconteça, são necessários 67 votos dos 100 senadores –cenário hoje considerado improvável.

“Esta deve ser a nossa chamada de atenção”, disse a deputada democrata Diana DeGette, também integrante da acusação. “Devemos condená-lo, porque a ameaça não acabou.”

Um dia depois de exibir vídeos inéditos da invasão registrados pelas câmeras de segurança do Congresso, a acusação mostrou aos senadores novas imagens, áudios e documentos, desta vez, focados em declarações de invasores que se diziam motivados por Trump na insurreição ao Capitólio.

“Fomos convidados aqui”, gritava um deles. “Estou obedecendo ao meu presidente”, corroborava o outro.
Diante das imagens nas telas de TV no plenário do Senado, a deputada DeGette concluiu: “Sabemos quem acendeu o pavio […] Eles vieram porque Trump mandou”.

Líder da acusação, o deputado Jamie Raskin ficou com o papel de fazer um apelo emocional aos senadores que, neste caso, são ao mesmo tempo jurados e testemunhas do que aconteceu naquele 6 de janeiro.

Ele pediu que os senadores usem “bom senso” e façam “justiça imparcial” para não criar um padrão terrível de má condução na Casa Branca.

“Se você não considera isso um crime e contravenção grave hoje, você estabeleceu um novo padrão terrível para a má conduta presidencial nos EUA.”

De acordo com Raskin, o ex-presidente tem um padrão de incitar violência cujo ápice foi a invasão ao Capitólio, mas outros exemplos podem se seguir caso ele retorne ao poder.

“Meus queridos colegas, há algum líder político nesta sala que acredita que, se algum dia fosse permitido pelo Senado a voltar ao Salão Oval, Donald Trump pararia de incitar a violência para conseguir o que quer?”, questionou Raskin. “Você apostaria a vida de mais policiais nisso? Você apostaria a segurança de sua família nisso? Você apostaria o futuro da sua democracia nisso?”

A estratégia democrata tenta provar que Trump gestou por meses o mais brutal ataque à democracia americana desde a Guerra Civil nos EUA e que é preciso responsabilizá-lo pelo danos que vão além das fissuras físicas no prédio do Congresso, dos cinco mortos e dos vários feridos.

O Senado hoje está dividido em 50 votos para democratas e 50 para os republicanos e não há apetite político por parte de 17 correligionários do ex-presidente para condená-lo neste momento.

A base do Partido Republicano está cada vez mais radicalizada à direita, e os senadores da sigla temem perder essa importante fatia do eleitorado –Trump teve 74 milhões de votos ante 81 milhões de Joe Biden.

Mesmo sabendo das dificuldades de convencer o outro lado, os democratas usaram 12 das 16 horas a que tinham direito para fazer a acusação, em uma abrangente linha do tempo que desaguou em Trump como o comandante-chefe do ataque.

Durante oito horas na quarta-feira (10) e quatro horas nesta quinta, eles tentaram apelar ao senso de patriotismo dos republicanos. Além dos vídeos inéditos e dos áudios dos invasores, mostraram depoimentos de pessoas do partido de Trump que votaram pelo impeachment na Câmara e de ex-secretários que renunciaram após a invasão do Congresso.

Segundo os democratas, os EUA ficaram constrangidos diante do mundo.

Ainda na quarta, porém, a maior parte dos senadores republicanos parecia impassível e, apesar da narrativa dramática apresentada pelos democratas, dizia não ver uma conexão forte suficiente entre Trump e a invasão do Capitólio a ponto de punir o líder do partido.

A sessão desta quinta começou ao meio-dia (14h de Brasília) com a reta final dos argumentos de acusação.

A partir desta sexta, é a vez da defesa de Trump, que tem também um prazo de 16 horas para apresentar seus argumentos, mas pretende terminar a exposição no mesmo dia.

A expectativa é que o veredito saia até o início da próxima semana.

Os advogados David Schoen, Bruce Castor, Michael van der Veen e William Brennan, que representam Trump, negam que o ex-presidente foi o responsável pelo ataque ou pretendia interferir no processo de certificação da vitória de Biden, em andamento no Capitólio naquele início de janeiro.

Os advogados dizem que o discurso de Trump –que pedia para que seus apoiadores “lutassem como nunca”– era “figurado” e está preservado pela Primeira Emenda da Constituição americana, que versa sobre liberdade de imprensa.


Fonte: FOLHAPRESS